Coisa vergonhosa meu primeiro post não passar de sinceros agradecimentos ao colega de nome impronunciável que se deu ao trabalho de ler minhas (e dos meus) garatujas lá no Pergaminhos...
Que Éris o abençoe e recompense pela paciência e generosidade. E o proteja do conteúdo daquele blog pernicioso e intimista.
"Step into my parlour, said the Spider to the Fly..."
Be good,
--Xochiquetzal =)
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“Everyone carries a piece of the puzzle. Nobody comes into your life by mere coincidence. Trust your instincts. Do the unexpected. Find THE OTHERS”
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31.7.07
Projeto Sái do Chão! -> Web Freak <-
Pergaminhos, Palimpsestos & Alfarrábios - blog da silenciosa colaboradora do tudismocroned Reverenda Xochiquetzal & amig@s. imperdível. 23 estrelas
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30.7.07
Individualismo
por Reverendo Peterson Cekemp
Eu sou individualista, e eudemonista. O eudemonismo é um adjetivo que procuro não usar, porque afinal de contas é um conceito que não domino totalmente, entretanto, gostei da definição no Wikipédia, então tomo a liberdade de me chamar assim, fica legal.
O que não significa que sou egoísta. Minha linha de pensamento individualista segue o seguinte lema, expresso através de linhas que representam meus pensamentos:
Domínio da razão sobre as emoções, certo? Certo. Dominei minhas emoções… E agora?
Que saco.
Não vou fazer isso não.
Opa! Mas espera um pouco, eu viro um escravo se eu não fizer isso…
Que saco, o que eu faço agora?
Eu procuro usar o domínio da razão pra conquistar objetivos que obedeçam aos sentimentos. Entendeu? Usar a razão pra cooperar com a emoção. É uma cooperação, no maior estilo anarco-coletivista.
Portanto, sou eudemonista porque, através do domínio das emoções, você vai ficar calmo, sereno… Tranqüilo… E vai perceber que é um saco. Aí, você vai querer mais, vai sair dessa tranqüilidade e vai passar a agir conscientemente pelo que você quer, mas quer de coração, não de mente. Entendeu?
Através do domínio das emoções, eu entendo que só o que vale a pena nessa vida é felicidade. Não o “estado de espírito” felicidade. Momentos felizes. Momentos. Segundos. Acontecimentos. Aqui e agora, o mais rápido possível, meu espírito tem fome de felicidade aqui e agora. Nada pra depois, oras!
Por isso sou eudemonista. E através da razão, isso me impede de viver igual a um animal procurando por sexo, drogas e rock’n’roll, sacou? ;)
Mas e quanto ao individualismo? Bom, há quem diga que quando atitudes individualistas são tomadas, todo mundo se fode. Bom, é algo que eu conheço muuuuuuuuito superficialmente, a tal teoria dos jogos. Dizem que funciona com a teoria da evolução, e funciona com a nossa sociedade.
Eu penso o seguinte: se cada um parasse de se preocupar com o outro, tanto de mandar no outro, quanto de julgar o outro, quanto de tentar sempre ser melhor que o outro, no sentido de humilhar o outro, enfim… Se cada um parasse de olhar pros lados e esquecer que existe pra viver a vida em função dos outros, e cada um vivesse a sua vida, todo mundo seria mais feliz.
Só que aí vêm dizer que o individualismo prejudica a sociedade em geral. É claro que prejudica! Somos educados (na base da lavagem cerebral) a nos doar pros outros, a servir aos outros, esperando em troca boa vontade e uma imagem positiva. O altruísmo evolucionário levado ao extremo.
O problema é que quando um espertinho começa a fazer tudo por si mesmo, os bobos que estão esperando que alguém faça alguma coisa por eles, ficam na mão. Há. É aí que o sistema se prejudica.
Então como é que eu defendo o individualismo? Eu defendo é que a teoria dos jogos está certa para a teoria da evolução e para a sociedade capitalista. A sociedade capitalista reproduz exatamente uma selva, uma barbaridade total. Os humanos viraram, afinal, animais educados pra se disfarçarem de humanos. Por isso é que não dá pra ser individualista na sociedade capitalista. Uma sociedade de vícios, de podres, de espertinhos que resolveram que iriam dominar a todos, e acabaram conseguindo, criando a Máquina ©. Não dá.
Agora, você me pergunta: daria pra ser individualista na sociedade capitalista?
Bom, daria sim. Daria pra ser individualista em uma sociedade em que ninguém se preocupasse em ficar escravizando as pessoas. Individualismo não é egoísmo, caramba. Que droga. Individualismo é confiar no potencial de cada um, do indivíduo. É pensar primeiro em si, depois nos outros. Egoísmo é pensar só em si mesmo, sem chance. Não é isso.
Não é isso mesmo.
por Reverendo Peterson Cekemp
Eu sou individualista, e eudemonista. O eudemonismo é um adjetivo que procuro não usar, porque afinal de contas é um conceito que não domino totalmente, entretanto, gostei da definição no Wikipédia, então tomo a liberdade de me chamar assim, fica legal.
O que não significa que sou egoísta. Minha linha de pensamento individualista segue o seguinte lema, expresso através de linhas que representam meus pensamentos:
Domínio da razão sobre as emoções, certo? Certo. Dominei minhas emoções… E agora?
Que saco.
Não vou fazer isso não.
Opa! Mas espera um pouco, eu viro um escravo se eu não fizer isso…
Que saco, o que eu faço agora?
Eu procuro usar o domínio da razão pra conquistar objetivos que obedeçam aos sentimentos. Entendeu? Usar a razão pra cooperar com a emoção. É uma cooperação, no maior estilo anarco-coletivista.
Portanto, sou eudemonista porque, através do domínio das emoções, você vai ficar calmo, sereno… Tranqüilo… E vai perceber que é um saco. Aí, você vai querer mais, vai sair dessa tranqüilidade e vai passar a agir conscientemente pelo que você quer, mas quer de coração, não de mente. Entendeu?
Através do domínio das emoções, eu entendo que só o que vale a pena nessa vida é felicidade. Não o “estado de espírito” felicidade. Momentos felizes. Momentos. Segundos. Acontecimentos. Aqui e agora, o mais rápido possível, meu espírito tem fome de felicidade aqui e agora. Nada pra depois, oras!
Por isso sou eudemonista. E através da razão, isso me impede de viver igual a um animal procurando por sexo, drogas e rock’n’roll, sacou? ;)
Mas e quanto ao individualismo? Bom, há quem diga que quando atitudes individualistas são tomadas, todo mundo se fode. Bom, é algo que eu conheço muuuuuuuuito superficialmente, a tal teoria dos jogos. Dizem que funciona com a teoria da evolução, e funciona com a nossa sociedade.
Eu penso o seguinte: se cada um parasse de se preocupar com o outro, tanto de mandar no outro, quanto de julgar o outro, quanto de tentar sempre ser melhor que o outro, no sentido de humilhar o outro, enfim… Se cada um parasse de olhar pros lados e esquecer que existe pra viver a vida em função dos outros, e cada um vivesse a sua vida, todo mundo seria mais feliz.
Só que aí vêm dizer que o individualismo prejudica a sociedade em geral. É claro que prejudica! Somos educados (na base da lavagem cerebral) a nos doar pros outros, a servir aos outros, esperando em troca boa vontade e uma imagem positiva. O altruísmo evolucionário levado ao extremo.
O problema é que quando um espertinho começa a fazer tudo por si mesmo, os bobos que estão esperando que alguém faça alguma coisa por eles, ficam na mão. Há. É aí que o sistema se prejudica.
Então como é que eu defendo o individualismo? Eu defendo é que a teoria dos jogos está certa para a teoria da evolução e para a sociedade capitalista. A sociedade capitalista reproduz exatamente uma selva, uma barbaridade total. Os humanos viraram, afinal, animais educados pra se disfarçarem de humanos. Por isso é que não dá pra ser individualista na sociedade capitalista. Uma sociedade de vícios, de podres, de espertinhos que resolveram que iriam dominar a todos, e acabaram conseguindo, criando a Máquina ©. Não dá.
Agora, você me pergunta: daria pra ser individualista na sociedade capitalista?
Bom, daria sim. Daria pra ser individualista em uma sociedade em que ninguém se preocupasse em ficar escravizando as pessoas. Individualismo não é egoísmo, caramba. Que droga. Individualismo é confiar no potencial de cada um, do indivíduo. É pensar primeiro em si, depois nos outros. Egoísmo é pensar só em si mesmo, sem chance. Não é isso.
Não é isso mesmo.
26.7.07
24.7.07
Da Polêmica Anarquista
por Reverendo Fernando Ganso
Gostaria de comentar brevemente o artigo do Murray Bookchyn "Uma crítica ao anarquismo como caos" onde faz severas críticas a Hakim Bey e ao anarquismo ontológico. Ora, Booktchyn em um delírio positivista parece não ser capaz de enxergar um palmo além do seu nariz, será que o anarquismo estará condenado a não aceitar a diferença? É certo que grande parte do anarquismo do século XIX e XX foram contra a désmesure e o descomedimento, foram contra qualquer apelo "individualista", e conseqüentemente singular, considerado logo como pequeno burguês. Assim tambem o foram as varias correntes marxistas e socialistas em geral. Coloquemos a questão: Qual é a autonomia que o anarquismo busca? É a auto(nomia) apenas social?
Muitos autores talvez gozem ao falar em ordem, Razão, organização, para mim, sinceramente, isto é um olhar de pirata. O tapa-olho as vezes atrapalha, e então ficamos presos a nosso tipo psicológico particular e o generalizamos como se o mundo devesse ser nossa imagem e semelhança. Quem é o pequeno burguês e o Einzige é difícil dizer. Não vou acusar mais o Bookchyn de caracinza, porque ele, embora caracinza, ainda é um cara legal, mas o anarquismo não pode ficar preso nessa austeridade apolinea, isso é burrice, é mesmo falta de compreensão de nosso Zeitgeist (espírito da época). Com certeza para nosso amigo os surrealistas deviam ser outros desses pequenos burgueses; esta é a mente de quem não consegue imaginar, é uma mente tipicamente da direita, masculina (seja o masculino do homem ou da mulher) é a mente do duro "Ateismo muscular", algo bem fálico. É um pensamento típico de alguem que acha que se mudando os meios materiais de uma sociedade, se dominarmos os meios de produção, se tivermos um pensamento voltado ao social os problemas estarão resolvidos.
Esquecemos que foi a direita, a atividade masculina, já que a força está normalmente na mão direita, que oprimiu através da força a mulher. O próprio tabu dos canhotos é fato consumado, um dos epitetos do diabo é canhoto. Já a superioridade da esquerda normalmente esteve ligada a matrilinhagem, a lua, a noite e ao feminino, lembremos ainda que o feminino sempre esteve ligado ao obscuro, desconhecido, ao gato e especialmente a imaginação e a magia (a exemplo lembremos os xamãs que se vestiam de mulher para entrar em contato com os espíritos). Retomemos, em prol do exemplo, a diferença de tratamento na linguagem entre a esquerda e a direita. Em latim, direita é dextra que se aproxima de decet "o que é conveniente" já a esquerda é sinistra, de mau pressagio, funesto, sinistro e em grego direita é deksiá e significa "de bom augúrio, favorável" e esquerda é aristerá, quer dizer, excelente, ótima.
Essa questão é também a disputa entre o apolineo e o dionisíaco, Apolo e Dioniso aparecem no campo de batalha. Lembremos primeiramente que Apolo foi na mitologia grega o deus principal da manutenção da ordem e dos antigos costumes, seus principais ditados eram o medèn ágan (μεδεν αγαν) nada em demasia, o sophro-sýne, a moderação e o gnôthi s´auton (γνοθι σ´αυτον) conhece-ti a ti mesmo, dessa forma Apolo evitava os excessos que ameaçassem a ordem social. A Razão ao ser desenvolvida foi o baluarte do iluminismo e da revolução industrial, a construção de uma sociedade pragmática, trabalhadora que estivesse compromissada com a funcionalidade capitalista.
Ora, Booktchyn fala ironicamente que adoraria ver Bey e seus discípulos nos "piqueniques" da Libertarian League, mas minha Nossa Senhora! Quem não tem prazer e não faz piquiniques numa revolução é que constrói sua própria derrota! Que a sociedade vindoura possa saborear um bom vinho e mesmo produzir orgias, que a sociedade vindoura saiba saborear, como Orfeu, a musica e a poesia. Lembremos quem eram os inimigos de Dioniso na sociedade grega: os Eupátridas, isto é, os aristrocratas. Bey trouxe de volta o êxtase (ekstasis) e o entusiasmo (enthusiasmus) que foram as principais formas nos rituais dionisíacos de ultrapassar o métron (a medida) e tornar-se um deus; segundo Brandão "O ékstatis, todavia, era apenas a primeira parte da grande integração com o deus: o sair de si implicava num mergulho no Dioniso e deste no seu adorador pelo processo de ενθουσιασμοs (enthusiasmós), de ενθεοs (éntheos), isto é, 'animado de um transporte divino', de εν (én), 'dentro, no âmago' e θεοs (theós), 'deus', quer dizer, o entusiasmo é ter um deus dentro de si, identificar-se com ele, co-participando da divindade". E ainda era com as Bacantes que os adoradores de Dioniso através da mania (loucura sagrada) e das orgias que se concretizava a comunhão com o deus. Nenhum outro deus ligava-se ao homem de tal forma.
Esse dionisíaco é sempre uma metamorfose (a isso re-lembremos as festas da antestérias), talvez por isso este lado assuste ao anarquismo que muitas vezes se deseja um sistema ideal, o Éden na terra, que aliás, é um dos grandes mitos do anarquismo, exatamente por isso teme o pecado da mudança (comer a maça), de se abrir portas proibidas (a caixa de pandora). Devemos deixar de ser tão moralistas e aceitar mais as diferenças, essas são as flechas que eu gostaria de lançar, com minha máscara do feminino Eros. Abrir um vaso de aceitação e acolhimento, mesmo que, muitas vezes, um vaso com pontas.
Que o anarquismo ontológico possa nos prover como meio de encontrar nossa singularidade, nossos momentos limites alterando-nos nas profundezas e não só na superfície e então, em devir, tornamo-nos juntamente com o mundo, um outro lugar. É preciso ser um suicida, como Nietzsche, amo aqueles que vivem como se extinguindo. O anarquismo não é um ponto final, mas uma abertura de caminhos, se não o é, que construamos este anarquismo ramificado de encruzilhadas e bifurcações. Como Janus Bifronte sigo com a Razão e a Imaginação, uma na frente e outra nas costas e de meu coração sai a voz que grita desesperadamente pela Aurora, por um novo dia.
Ainda há vida por entre Bey e Bookchyn, no meio, intermezzo. Fnord.
por Reverendo Fernando Ganso
Gostaria de comentar brevemente o artigo do Murray Bookchyn "Uma crítica ao anarquismo como caos" onde faz severas críticas a Hakim Bey e ao anarquismo ontológico. Ora, Booktchyn em um delírio positivista parece não ser capaz de enxergar um palmo além do seu nariz, será que o anarquismo estará condenado a não aceitar a diferença? É certo que grande parte do anarquismo do século XIX e XX foram contra a désmesure e o descomedimento, foram contra qualquer apelo "individualista", e conseqüentemente singular, considerado logo como pequeno burguês. Assim tambem o foram as varias correntes marxistas e socialistas em geral. Coloquemos a questão: Qual é a autonomia que o anarquismo busca? É a auto(nomia) apenas social?
Muitos autores talvez gozem ao falar em ordem, Razão, organização, para mim, sinceramente, isto é um olhar de pirata. O tapa-olho as vezes atrapalha, e então ficamos presos a nosso tipo psicológico particular e o generalizamos como se o mundo devesse ser nossa imagem e semelhança. Quem é o pequeno burguês e o Einzige é difícil dizer. Não vou acusar mais o Bookchyn de caracinza, porque ele, embora caracinza, ainda é um cara legal, mas o anarquismo não pode ficar preso nessa austeridade apolinea, isso é burrice, é mesmo falta de compreensão de nosso Zeitgeist (espírito da época). Com certeza para nosso amigo os surrealistas deviam ser outros desses pequenos burgueses; esta é a mente de quem não consegue imaginar, é uma mente tipicamente da direita, masculina (seja o masculino do homem ou da mulher) é a mente do duro "Ateismo muscular", algo bem fálico. É um pensamento típico de alguem que acha que se mudando os meios materiais de uma sociedade, se dominarmos os meios de produção, se tivermos um pensamento voltado ao social os problemas estarão resolvidos.
Esquecemos que foi a direita, a atividade masculina, já que a força está normalmente na mão direita, que oprimiu através da força a mulher. O próprio tabu dos canhotos é fato consumado, um dos epitetos do diabo é canhoto. Já a superioridade da esquerda normalmente esteve ligada a matrilinhagem, a lua, a noite e ao feminino, lembremos ainda que o feminino sempre esteve ligado ao obscuro, desconhecido, ao gato e especialmente a imaginação e a magia (a exemplo lembremos os xamãs que se vestiam de mulher para entrar em contato com os espíritos). Retomemos, em prol do exemplo, a diferença de tratamento na linguagem entre a esquerda e a direita. Em latim, direita é dextra que se aproxima de decet "o que é conveniente" já a esquerda é sinistra, de mau pressagio, funesto, sinistro e em grego direita é deksiá e significa "de bom augúrio, favorável" e esquerda é aristerá, quer dizer, excelente, ótima.
Essa questão é também a disputa entre o apolineo e o dionisíaco, Apolo e Dioniso aparecem no campo de batalha. Lembremos primeiramente que Apolo foi na mitologia grega o deus principal da manutenção da ordem e dos antigos costumes, seus principais ditados eram o medèn ágan (μεδεν αγαν) nada em demasia, o sophro-sýne, a moderação e o gnôthi s´auton (γνοθι σ´αυτον) conhece-ti a ti mesmo, dessa forma Apolo evitava os excessos que ameaçassem a ordem social. A Razão ao ser desenvolvida foi o baluarte do iluminismo e da revolução industrial, a construção de uma sociedade pragmática, trabalhadora que estivesse compromissada com a funcionalidade capitalista.
Ora, Booktchyn fala ironicamente que adoraria ver Bey e seus discípulos nos "piqueniques" da Libertarian League, mas minha Nossa Senhora! Quem não tem prazer e não faz piquiniques numa revolução é que constrói sua própria derrota! Que a sociedade vindoura possa saborear um bom vinho e mesmo produzir orgias, que a sociedade vindoura saiba saborear, como Orfeu, a musica e a poesia. Lembremos quem eram os inimigos de Dioniso na sociedade grega: os Eupátridas, isto é, os aristrocratas. Bey trouxe de volta o êxtase (ekstasis) e o entusiasmo (enthusiasmus) que foram as principais formas nos rituais dionisíacos de ultrapassar o métron (a medida) e tornar-se um deus; segundo Brandão "O ékstatis, todavia, era apenas a primeira parte da grande integração com o deus: o sair de si implicava num mergulho no Dioniso e deste no seu adorador pelo processo de ενθουσιασμοs (enthusiasmós), de ενθεοs (éntheos), isto é, 'animado de um transporte divino', de εν (én), 'dentro, no âmago' e θεοs (theós), 'deus', quer dizer, o entusiasmo é ter um deus dentro de si, identificar-se com ele, co-participando da divindade". E ainda era com as Bacantes que os adoradores de Dioniso através da mania (loucura sagrada) e das orgias que se concretizava a comunhão com o deus. Nenhum outro deus ligava-se ao homem de tal forma.
Esse dionisíaco é sempre uma metamorfose (a isso re-lembremos as festas da antestérias), talvez por isso este lado assuste ao anarquismo que muitas vezes se deseja um sistema ideal, o Éden na terra, que aliás, é um dos grandes mitos do anarquismo, exatamente por isso teme o pecado da mudança (comer a maça), de se abrir portas proibidas (a caixa de pandora). Devemos deixar de ser tão moralistas e aceitar mais as diferenças, essas são as flechas que eu gostaria de lançar, com minha máscara do feminino Eros. Abrir um vaso de aceitação e acolhimento, mesmo que, muitas vezes, um vaso com pontas.
Que o anarquismo ontológico possa nos prover como meio de encontrar nossa singularidade, nossos momentos limites alterando-nos nas profundezas e não só na superfície e então, em devir, tornamo-nos juntamente com o mundo, um outro lugar. É preciso ser um suicida, como Nietzsche, amo aqueles que vivem como se extinguindo. O anarquismo não é um ponto final, mas uma abertura de caminhos, se não o é, que construamos este anarquismo ramificado de encruzilhadas e bifurcações. Como Janus Bifronte sigo com a Razão e a Imaginação, uma na frente e outra nas costas e de meu coração sai a voz que grita desesperadamente pela Aurora, por um novo dia.
Ainda há vida por entre Bey e Bookchyn, no meio, intermezzo. Fnord.
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22.7.07
Feitiços e Simpatias Lispectorianos-Finalmente liberado o Codex Lispector de Magia Erisiana
Após os acontecimentos caóticos dessa semana recebemos as seguintes mandingas enviadas do subalém primordial. O capeta agora pode tirar férias! Sua HP de cálculos cósmicos ,infelizmente, cumpriu muito bem seu destino essa semana. Aqui serão disponibilizados simpatias-feitiços discordianas que ajudarão você a tornar sua glãndula pineal mais aguçada e sensível as vibrações Erisianas....Mas, primeiro, antes da realização de qualquer uma dessas simpatias, é preciso orar para nossa Gran Sacerdotiza Mor Clarice Lispector, pronunciando a seguinte oração concebida pela própria:
"Não me posso resumir porque não se pode somar uma cadeira e duas maçãs.Eu sou uma cadeira e duas maçãs.E não me somo."
Simpatia para a Lua-><-
Em noite de Lua cheia(somente em noite de Lua cheia)pegue uma maçã e vá para algum lugar onde possa avistar a Lua cheia. Coma a maçã olhando para a Lua Cheia. Quando terminar de come-la, grite olhando para a Lua Cheia: "Sua bola gorda!" *Resultado: Nada acontecerá, a não ser que a Lua te responda. O que pode ou não acontecer...verifique o histórico mental da sua família...mas é ótimo para aliviar as tensões...
Simpatia para trazer tripla proteção de Èris** (Também conhecida como Ritual da Esnobada Copiada)-><-
Simpatia para trazer tripla proteção de Èris** (Também conhecida como Ritual da Esnobada Copiada)-><-
Novamente pegue uma maçã.Pegue cola e purpurina dourada (ou qualquer coisa do genêro). Buzunte a maçã de cola e a banhe com a purpurina dourada. Inscreva na maçã com uma faca (ou qualquer coisa do genêro) a palavra "Kallisti". Depois, de posse da maçã fake, invada algum desfile da Iran Fashion Week. (Acredite, existe uma semana de moda no Iran). Logo, em seguida, invada o camarin onde estão Kate Moss, Gisele Bundchen e Heidi Klum. Jogue a maçã nelas ou entre elas e espere...espere...deixe claro que você não é um ativista do P.e.t.a. e continue esperando...aguarde...-><-
1)Gisele Bundchen pegará a maçã e tentará ler o que está escrito...
2)Heidi Klum tomará a maçã da mão de Gisele, tentará ler o que está escrito, e dirá á Gisele: "Kalliste é sua mãe! Sua magrela peituda!"
3)Gisele a empurrará dizendo: "E daí?Quem disse que eu to com fome?"
4) Kate Moss não fará nada porque estará no meio de uma viagem psicotrópica
5)Em suma , nenhuma das supermodelos comerá a maçã, porque são anoréxicas.
6) Nenhuma delas entenderá o que está escrito na maçã e tampouco saberão pronunciar o que está escrito porque obviamente são modelos.
7)Porém, todas saberão quantas calorias tem a maçã!
8)Depois perguntarão á você se Kallisti é alguma modelo iraniana.
9) Elas jogarão a maçã no lixo.
10) Kate Moss pegará a maçã pensando ser um dente do ouro gigante trazido pela fada do dente , com quem até então tinha tirado dúvidas sobre clareamento dental.
11) Você poderá ser preso por tentativa de terrorismo dando origem a uma crise diplomática mundial que resultará na terceira guerra mundial...ou não...
*Resultado: Se você conseguir atingir esse empreendimento, trará Èris á Terra para tomar um chá com você e terá conseguido a façanha de realizar a Esnobada Copiada!
10.7.07
Do Surrealismo
por Ricardo de Mattos
Vários os movimentos artísticos que brotaram durante a primeira metade do século XX, posicionando-se merecidamente o Surrealismo entre os de maior consistência teórica e dos mais impressionantes pelos princípios estéticos desenvolvidos. Foi um dos mais duradouros, encaixando-se um pouco além do período entre guerras, pois os Prolegômenos De Um Terceiro Manifesto do Surrealismo Ou Não (sic) datam de 1.942. Além de Surrealismo, é costume referir-se ao movimento artístico como Supra Realismo e Super Realismo, havendo em Portugal quem defenda a expressão Sobre Realismo.
A semente do Surrealismo encontra-se no Dadaismo, mas costumam ser apontados como precursores remotos os poetas Rimbaud e Lautéamont, este autor dos Cantos de Maldoror. Também no movimento romântico os surrealistas foram buscar exemplos e fundamentos para suas teorias. O que fortaleceu o Surrealismo foi o acompanhamento e estudo pelos seus expoentes - encabeçados por André Breton - das então recentes descobertas de Sigmund Freud. Nem fortaleceu, o movimento calcou-se principalmente nestas descobertas, mas não sem uma interpretação pessoal e ainda insipiente, dada a novidade da matéria. Daí o carácter inaugural do Surrealismo, nem contestador, nem renovador. Rejeitava-se a "Arte Pela Arte" e a "Revolução Pela Revolução".
Uma das preocupações dos surrealistas era libertar o homem de uma vida predominantemente utilitária. Outra, emparelhar sua realidade profunda e a superficial. Os avanços da psicanálise indicaram-lhes veredas que passaram a explorar com avidez. O homem não deveria fugir da realidade, mas enfrentá-la. E a realidade a ser desvendada não é aquela superficial e corriqueira, porém a recalcada, sufocada em cada indivíduo. A Arte além de ser o melhor meio de expressão dos estados psíquicos, seria o melhor instrumento para alavancar o homem de seu interior profundo. Mesmo que se acredite no ser humano como composto de corpo físico e corpo espiritual, ao se tratar do Surrealismo fica-se mais à vontade limitando-se a falar apenas em "mente", e nisso percebemos sua face materialista e sua imanência. Descobrindo-se que o ser humano não é só aquilo em hodierno mostrado, são afastadas - ou mesmo abandonadas - as questões espirituais. Vamos ver primeiro o que o homem escondeu por todos estes séculos em seu âmago, para depois estudar se isto tem vida além da morte, se vai para o Céu, para o Inferno, ou se ficará perambulando pelo Nada.
A leitura do capítulo catorze do livro O Desconcerto do Mundo - do Renascimento ao Surrealismo, de Carlos Felipe Moisés, dá a impressão do movimento ter tido em Portugal uma conotação mais política - antisalazarista - que artística. Mais de contestação e de privilégio do choque que de investigação e chamamento à interiorização. No entanto, o Surrealismo original era declaradamente apolítico, apenas aliando-se surrealistas e comunistas por ocasião da guerra do Marrocos, mas sem intuito de confusão das doutrinas. Defendiam aqueles o máximo desvinculamento e liberdade, principalmente em relação à sociedade, devido à precisão de se livrar o homem da couraça por ele vestida perante ela. Nada externo deveria permanecer.
O Surrealismo considera a realidade aparente como insuficiente para o descobrimento da Verdade das coisas e para o conhecimento total do indivíduo. Como valer-se dos dados mesquinhos oferecidos no cotidiano, se o interessante ao conhecimento é soterrado pela convenção e pelo disfarce? A realidade apresentada em nada auxilia, está comprometida, ou mesmo invalidada, pois algo muito mais consistente foi abafado. A tarefa surreal era revelar uma Supra Realidade (o inconsciente, o inibido) e aproximá-la da Realidade, harmonizando-as, e n'esta equiparação entre o ser e o poder-ser, projectar um homem integral a horizontes mais amplos. É esta intenção em encarar o desconhecido no homem que impede em se ver o Surrealismo como uma apologia à fuga.
E também não se trata de um mero apelo ao irreal ou fantasioso. Filosoficamente pode-se explicar o Surrealismo como esta síntese que (I) não aceita o real como posto e (II) nem admite a saída fácil para a fantasia. O ideal é uma nova ordem abrangente do racional e do irracional, considerando-se a mente receptiva o suficiente ao estranho, sendo este um conceito antecipado àquelas coisas que ainda não foram estudadas.
Nesta introspecção, o surrealista valia-se do Humor, da Imaginação e da Loucura.
O Humor era procurado por seu carácter demolidor. Ridicularizava-se a realidade com o intuito de desacreditá-la, mesmo que fosse necessário chocar. Mostrando o ridículo, facilitava-se o desligamento com o superficial.
A exploração da Imaginação foi o que mais rendeu aos surrealistas. A capacidade de formar imagens ou combinar as percebidas era um prato cheio, pois o domínio da imaginação pode ter uma realidade tão grande quanto vislumbrada na vigília. E é o sonho o domínio da imaginação, pois neste "campo" ela encontra um curso livre principalmente do senso crítico. Algum filósofo da Antiguidade andou questionando a realidade que deveria ser considerada, se a de quando estamos acordados, se a de quando dormimos. Tão séria foi considerada esta descoberta, que o sonho passou a ter a mesma importância do pensamento na aquisição de conhecimento. Segundo Freud, o homem chegaria a uma consciência integral de si mesmo ao decifrar este mundo, com seus símbolos, desejos e inclinações reprimidas. Uma das consequências desta Supra Realidade oferecida pela imaginação é a eliminação do questionamento da possibilidade. Hoje parece fútil, mas vá ver o reboliço destas afirmações na época. O ser humano foi pego em posição constrangedora.
A consequência artística para esta observação dos sonhos, foi o estudo e acompanhamento da escrita automática, e neste campo entramos pela diferenciação entre concepção e execução. Todos já devem ter percebido que ao nos deitarmos, há um estado limite entre o sono e a vigília, no qual alguns ouvem vozes, outros murmuram, outros têm sobressaltos - eu tenho a impressão de queda neste momento. Pois bem, o poeta surrealista vê estes murmúrios e audições como elementos poéticos de primeira grandeza, pois o inconsciente impera e nenhuma regra constrange a pessoa neste instante. Até a hipnose é combatida, para que se chegue a este resultado naturalmente, sem a mínima provocação. Estas manifestações são avidamente anotadas e o resultado, seja qual for, é tido como poesia. Diante disso, podemos afirmar que o Surrealismo lida apenas com o expontâneo. Não lhe interessa o arrumado. Uma imagem surrealista não pode ser tida por metáfora nem, ao menos a priori, por fantasia. Um poeta qualquer compara o Tempo a um cavalo branco passando a pleno galope. O poeta surrealista menciona um cavalo branco a pleno galope e do contexto, da combinação com outras imagens que ele nos dá, tentamos inferir tratar-se do Tempo. Deve-se a esta suprema introspecção a critica recebida pelo movimento, pois tal subjectivismo impedia a compreensão alheia.
Além do humor e da imaginação, a Loucura mereceu cuidadosa análise. O facto de uma pessoal normal sonhar coisas absurdas levou a atentar às imagens dos alienados e à análise dos raciocínios feitos por eles. Os loucos não se adaptam à existência cotidiana, mas em seu mundo há tanta estabilidade quanto no nosso. Talvez até mais. Os alienados e suas imagens: eis o que trouxe a arte aos manicómios como forma de terapia. Neste ponto são vários os aspectos a serem considerados. O surrealista busca este estado de anormalidade mesmo precisando alienar-se temporariamente, aqui sim recorrendo a meios artificiais e repetindo os actos de alguns românticos - conta-se do recurso ao ópio, por Colleridge. O surrealista faz esta expedição ao inconsciente, mas de forma a poder voltar e contar suas visões. Ele almeja reconstruir certos delírios.
Outro ponto: descobrir mais sobre o raciocínio do homem normal valendo-se do raciocínio do alienado, considerando-o portador de uma lógica a nos escapar. O paranóico, por exemplo, além de refugiar-se n'um mundo particular, amolda a realidade circundante aos seus delírios. Aí o que intrigava os artistas da época, pois admitindo-se o ponto de partida do paranóico, e olhando a realidade a partir de sua perspectiva, tudo se deduzia com muita lógica e seguro encadeamento. Na síntese do real com o imaginário, aliado a este desconcertante encadeamento, considerava-se o pensamento alienado como uma amplificação do pensamento normal, com elos a nós despercebidos, e portanto digno de escrupuloso estudo. O Agressor, de Rosário Fusco, é um exemplo perfeito desta investigação e reconstrução, e não se pode dizer que falta lógica a David em usas cogitações. Ao contrário, sua ideia segue um curso linear exemplar.
Proposital ou não, no livro A Obscena Senhora D, de Hilda Hilst, embora publicado em 1.982, encontramos vários destes elementos. A começar pela pontuação do texto. Todo o livro parece ser um apanhado das reflexões, memórias e monólogos interiores da personagem Hillé. Costumamos pontuar as orações em nossa mente, iniciá-las com letras maiúsculas, tal como se as transcrevêssemos no papel? Não, ou nem todos. Pois bem, em todo o texto vemos esta fuga às regras gramaticais, bem ao gosto dos surrealistas. É buscar na execução, a grafia do pensamento o mais próximo possível de como concebido. Se na obra de Hilda Hilst esta fuga às regras é uma constante, neste livro especialmente acabou por reforçar-lhe o carácter surreal.
A personagem é uma moderna Diógenes, encolhida n'um desvão de escada, procurando o sentido da vida e das coisas: "sessenta anos à procura do sentido das coisas". Pesquisa O "Eu" tão profundamente que no ponto onde chega estabelece algo como uma dízima periódica do raciocínio:
"Los rios, las cadenas, la cárcel, o cárcere de si mesma, sessenta anos, adeus, Hillé, desconheces quase toda sua totalidade, que contornos havia aos quinze anos aos vinte, lá dentro do ventre, que águas, plasma e sangue, que rio te contornava? que geografia se desenhava no teu rosto, e o rosto daquela que te carregava na barriga, como era? como te carregava essa que habitavas? como eras, Hillé, antes que o amor surgisse entre aquelas duas almas, pai-mãe, quando ele era jovem e se perguntava que mulher se deitaria sob seu grande corpo..."
Mas também sua origem e sua posição na ordem geral do Universo:
"a vida foi, Hillé, como se eu tocasse sozinho um instrumento, qualquer um, baixo flautim, pistão, oboé, como se eu tocasse sozinho apenas um momento da partitura, mas o concerto todo onde está?"
Esta devassa íntima evidentemente origina o desencaixe da personagem do meio no qual vive, perseguições, deboche, etc. E o Humor tem lugar quando, importunada por vizinhos empenhados em fazê-la "mudar de vida", Hillé levanta suas saias e expõe-se, chocando a todos. Este o ponto no qual lembrei do cínico grego.
A Loucura está presente no livro a ponto de imaginá-lo autobiográfico. O pai da autora, assim como o da personagem, morreu em um hospício. Outros dois pontos: amor pelos cães - H.H. tem mais de setenta - e o refúgio em uma "Casa do Sol". Todavia, a personagem lamenta a morte de seu amante, e este facto não consta da biografia da escritora. Hillé não enlouquece, mas beira a insanidade em sua busca do conhecimento, encontrando com a morte ao menos parte das respostas as suas indagações.
por Ricardo de Mattos
Vários os movimentos artísticos que brotaram durante a primeira metade do século XX, posicionando-se merecidamente o Surrealismo entre os de maior consistência teórica e dos mais impressionantes pelos princípios estéticos desenvolvidos. Foi um dos mais duradouros, encaixando-se um pouco além do período entre guerras, pois os Prolegômenos De Um Terceiro Manifesto do Surrealismo Ou Não (sic) datam de 1.942. Além de Surrealismo, é costume referir-se ao movimento artístico como Supra Realismo e Super Realismo, havendo em Portugal quem defenda a expressão Sobre Realismo.
A semente do Surrealismo encontra-se no Dadaismo, mas costumam ser apontados como precursores remotos os poetas Rimbaud e Lautéamont, este autor dos Cantos de Maldoror. Também no movimento romântico os surrealistas foram buscar exemplos e fundamentos para suas teorias. O que fortaleceu o Surrealismo foi o acompanhamento e estudo pelos seus expoentes - encabeçados por André Breton - das então recentes descobertas de Sigmund Freud. Nem fortaleceu, o movimento calcou-se principalmente nestas descobertas, mas não sem uma interpretação pessoal e ainda insipiente, dada a novidade da matéria. Daí o carácter inaugural do Surrealismo, nem contestador, nem renovador. Rejeitava-se a "Arte Pela Arte" e a "Revolução Pela Revolução".
Uma das preocupações dos surrealistas era libertar o homem de uma vida predominantemente utilitária. Outra, emparelhar sua realidade profunda e a superficial. Os avanços da psicanálise indicaram-lhes veredas que passaram a explorar com avidez. O homem não deveria fugir da realidade, mas enfrentá-la. E a realidade a ser desvendada não é aquela superficial e corriqueira, porém a recalcada, sufocada em cada indivíduo. A Arte além de ser o melhor meio de expressão dos estados psíquicos, seria o melhor instrumento para alavancar o homem de seu interior profundo. Mesmo que se acredite no ser humano como composto de corpo físico e corpo espiritual, ao se tratar do Surrealismo fica-se mais à vontade limitando-se a falar apenas em "mente", e nisso percebemos sua face materialista e sua imanência. Descobrindo-se que o ser humano não é só aquilo em hodierno mostrado, são afastadas - ou mesmo abandonadas - as questões espirituais. Vamos ver primeiro o que o homem escondeu por todos estes séculos em seu âmago, para depois estudar se isto tem vida além da morte, se vai para o Céu, para o Inferno, ou se ficará perambulando pelo Nada.
A leitura do capítulo catorze do livro O Desconcerto do Mundo - do Renascimento ao Surrealismo, de Carlos Felipe Moisés, dá a impressão do movimento ter tido em Portugal uma conotação mais política - antisalazarista - que artística. Mais de contestação e de privilégio do choque que de investigação e chamamento à interiorização. No entanto, o Surrealismo original era declaradamente apolítico, apenas aliando-se surrealistas e comunistas por ocasião da guerra do Marrocos, mas sem intuito de confusão das doutrinas. Defendiam aqueles o máximo desvinculamento e liberdade, principalmente em relação à sociedade, devido à precisão de se livrar o homem da couraça por ele vestida perante ela. Nada externo deveria permanecer.
O Surrealismo considera a realidade aparente como insuficiente para o descobrimento da Verdade das coisas e para o conhecimento total do indivíduo. Como valer-se dos dados mesquinhos oferecidos no cotidiano, se o interessante ao conhecimento é soterrado pela convenção e pelo disfarce? A realidade apresentada em nada auxilia, está comprometida, ou mesmo invalidada, pois algo muito mais consistente foi abafado. A tarefa surreal era revelar uma Supra Realidade (o inconsciente, o inibido) e aproximá-la da Realidade, harmonizando-as, e n'esta equiparação entre o ser e o poder-ser, projectar um homem integral a horizontes mais amplos. É esta intenção em encarar o desconhecido no homem que impede em se ver o Surrealismo como uma apologia à fuga.
E também não se trata de um mero apelo ao irreal ou fantasioso. Filosoficamente pode-se explicar o Surrealismo como esta síntese que (I) não aceita o real como posto e (II) nem admite a saída fácil para a fantasia. O ideal é uma nova ordem abrangente do racional e do irracional, considerando-se a mente receptiva o suficiente ao estranho, sendo este um conceito antecipado àquelas coisas que ainda não foram estudadas.
Nesta introspecção, o surrealista valia-se do Humor, da Imaginação e da Loucura.
O Humor era procurado por seu carácter demolidor. Ridicularizava-se a realidade com o intuito de desacreditá-la, mesmo que fosse necessário chocar. Mostrando o ridículo, facilitava-se o desligamento com o superficial.
A exploração da Imaginação foi o que mais rendeu aos surrealistas. A capacidade de formar imagens ou combinar as percebidas era um prato cheio, pois o domínio da imaginação pode ter uma realidade tão grande quanto vislumbrada na vigília. E é o sonho o domínio da imaginação, pois neste "campo" ela encontra um curso livre principalmente do senso crítico. Algum filósofo da Antiguidade andou questionando a realidade que deveria ser considerada, se a de quando estamos acordados, se a de quando dormimos. Tão séria foi considerada esta descoberta, que o sonho passou a ter a mesma importância do pensamento na aquisição de conhecimento. Segundo Freud, o homem chegaria a uma consciência integral de si mesmo ao decifrar este mundo, com seus símbolos, desejos e inclinações reprimidas. Uma das consequências desta Supra Realidade oferecida pela imaginação é a eliminação do questionamento da possibilidade. Hoje parece fútil, mas vá ver o reboliço destas afirmações na época. O ser humano foi pego em posição constrangedora.
A consequência artística para esta observação dos sonhos, foi o estudo e acompanhamento da escrita automática, e neste campo entramos pela diferenciação entre concepção e execução. Todos já devem ter percebido que ao nos deitarmos, há um estado limite entre o sono e a vigília, no qual alguns ouvem vozes, outros murmuram, outros têm sobressaltos - eu tenho a impressão de queda neste momento. Pois bem, o poeta surrealista vê estes murmúrios e audições como elementos poéticos de primeira grandeza, pois o inconsciente impera e nenhuma regra constrange a pessoa neste instante. Até a hipnose é combatida, para que se chegue a este resultado naturalmente, sem a mínima provocação. Estas manifestações são avidamente anotadas e o resultado, seja qual for, é tido como poesia. Diante disso, podemos afirmar que o Surrealismo lida apenas com o expontâneo. Não lhe interessa o arrumado. Uma imagem surrealista não pode ser tida por metáfora nem, ao menos a priori, por fantasia. Um poeta qualquer compara o Tempo a um cavalo branco passando a pleno galope. O poeta surrealista menciona um cavalo branco a pleno galope e do contexto, da combinação com outras imagens que ele nos dá, tentamos inferir tratar-se do Tempo. Deve-se a esta suprema introspecção a critica recebida pelo movimento, pois tal subjectivismo impedia a compreensão alheia.
Além do humor e da imaginação, a Loucura mereceu cuidadosa análise. O facto de uma pessoal normal sonhar coisas absurdas levou a atentar às imagens dos alienados e à análise dos raciocínios feitos por eles. Os loucos não se adaptam à existência cotidiana, mas em seu mundo há tanta estabilidade quanto no nosso. Talvez até mais. Os alienados e suas imagens: eis o que trouxe a arte aos manicómios como forma de terapia. Neste ponto são vários os aspectos a serem considerados. O surrealista busca este estado de anormalidade mesmo precisando alienar-se temporariamente, aqui sim recorrendo a meios artificiais e repetindo os actos de alguns românticos - conta-se do recurso ao ópio, por Colleridge. O surrealista faz esta expedição ao inconsciente, mas de forma a poder voltar e contar suas visões. Ele almeja reconstruir certos delírios.
Outro ponto: descobrir mais sobre o raciocínio do homem normal valendo-se do raciocínio do alienado, considerando-o portador de uma lógica a nos escapar. O paranóico, por exemplo, além de refugiar-se n'um mundo particular, amolda a realidade circundante aos seus delírios. Aí o que intrigava os artistas da época, pois admitindo-se o ponto de partida do paranóico, e olhando a realidade a partir de sua perspectiva, tudo se deduzia com muita lógica e seguro encadeamento. Na síntese do real com o imaginário, aliado a este desconcertante encadeamento, considerava-se o pensamento alienado como uma amplificação do pensamento normal, com elos a nós despercebidos, e portanto digno de escrupuloso estudo. O Agressor, de Rosário Fusco, é um exemplo perfeito desta investigação e reconstrução, e não se pode dizer que falta lógica a David em usas cogitações. Ao contrário, sua ideia segue um curso linear exemplar.
Proposital ou não, no livro A Obscena Senhora D, de Hilda Hilst, embora publicado em 1.982, encontramos vários destes elementos. A começar pela pontuação do texto. Todo o livro parece ser um apanhado das reflexões, memórias e monólogos interiores da personagem Hillé. Costumamos pontuar as orações em nossa mente, iniciá-las com letras maiúsculas, tal como se as transcrevêssemos no papel? Não, ou nem todos. Pois bem, em todo o texto vemos esta fuga às regras gramaticais, bem ao gosto dos surrealistas. É buscar na execução, a grafia do pensamento o mais próximo possível de como concebido. Se na obra de Hilda Hilst esta fuga às regras é uma constante, neste livro especialmente acabou por reforçar-lhe o carácter surreal.
A personagem é uma moderna Diógenes, encolhida n'um desvão de escada, procurando o sentido da vida e das coisas: "sessenta anos à procura do sentido das coisas". Pesquisa O "Eu" tão profundamente que no ponto onde chega estabelece algo como uma dízima periódica do raciocínio:
"Los rios, las cadenas, la cárcel, o cárcere de si mesma, sessenta anos, adeus, Hillé, desconheces quase toda sua totalidade, que contornos havia aos quinze anos aos vinte, lá dentro do ventre, que águas, plasma e sangue, que rio te contornava? que geografia se desenhava no teu rosto, e o rosto daquela que te carregava na barriga, como era? como te carregava essa que habitavas? como eras, Hillé, antes que o amor surgisse entre aquelas duas almas, pai-mãe, quando ele era jovem e se perguntava que mulher se deitaria sob seu grande corpo..."
Mas também sua origem e sua posição na ordem geral do Universo:
"a vida foi, Hillé, como se eu tocasse sozinho um instrumento, qualquer um, baixo flautim, pistão, oboé, como se eu tocasse sozinho apenas um momento da partitura, mas o concerto todo onde está?"
Esta devassa íntima evidentemente origina o desencaixe da personagem do meio no qual vive, perseguições, deboche, etc. E o Humor tem lugar quando, importunada por vizinhos empenhados em fazê-la "mudar de vida", Hillé levanta suas saias e expõe-se, chocando a todos. Este o ponto no qual lembrei do cínico grego.
A Loucura está presente no livro a ponto de imaginá-lo autobiográfico. O pai da autora, assim como o da personagem, morreu em um hospício. Outros dois pontos: amor pelos cães - H.H. tem mais de setenta - e o refúgio em uma "Casa do Sol". Todavia, a personagem lamenta a morte de seu amante, e este facto não consta da biografia da escritora. Hillé não enlouquece, mas beira a insanidade em sua busca do conhecimento, encontrando com a morte ao menos parte das respostas as suas indagações.
3.7.07
Era das Conseqüências
“Era das Conseqüências” é uma série de livros escrita pelo Reverendo Peterson Cekemp da Cabala Discordiana Orkutcídio em Massa para Adoradores de Lasagna.
A série mistura elementos do gênero de batalhas épicas com ficção científica e reflexão filosófica. De inspiração assumidamente discordiana.
O Reverendo explica:
"A proposta é um grande desafio: ser discordiano em relação ao discordianismo. Quando se lê sobre a história do universo da Era das Conseqüências pode-se pensar que ele não é exatamente bom. Na verdade, não funciona assim. Quando escrevi a história, quis ilustrar uma mudança de contracultura para, de certa forma, algo mais sério, e o desafio, durante algum tempo, foi: como manter as bases de contracultura, agora que a idéia parece estar tão difundida?
Apesar de algum tempo entre essa dúvida, foi necessário arregaçar as mangas e partir para a ação e mais propagação. Então entramos no ativismo: as influências anarquistas fizeram com que fosse imprescindível tomar uma decisão: vamos continuar vivendo uma vida anti-sistema dentro de um sistema? Era hora de mudar isso. Todas as ferramentas estavam à disposição.
A difusão do discordianismo fez com que a mensagem se tornasse um telefone sem fio que distorceu também a mensagem. É o preço a pagar. Isso deu início a uma separação intelectualismo-povo. O povo discordiano pensando de um jeito (o discordianismo é bom, vamos implementá-lo lutando pela nossa emancipação contra os senhores capitalistas), e os reverendos que viam isso como uma marginalização da mensagem discordiana original. Mas enfim, dali em diante o sonho de uma grande nação discordiana foi alimentado de geração em geração, e a guerra foi inevitável. Só depois do acontecido foi possível olhar e dizer: “nossa, o que foi que nós, discordianos, fizemos?”. Mas segundo os vencedores da guerra da luz, havia sido muito esforço (realizado de modo negativo, por assim dizer) por uma causa muito boa, para que tudo fosse jogado fora. Por isso a força para que o sistema se mantivesse…
Veja o que tentei fazer: ser discordiano em relação ao discordianismo. Tentei mostrar o lado ruim de uma massificação (ainda mais que o discordianismo sofreu, como eu especifiquei no livro, uma influência não descriminada de anarquismo, anarquismo radical e democracia em geral…) de uma mensagem hoje ainda confusa, porém clara em sua base. Tentei explorar ao máximo isso, mas parece que no livro tudo parece muito igual.
Por isso escreverei mais histórias extras (pequenos contos) pra ilustrar um pouco de várias épocas retratadas na minha história. Pra entender melhor. Não fique preocupado. A história vai ter tudo reforçado: os próximos livros virão com as coisas que interessam realmente mais fortes e a operação: mindfuck vai começar."
Faça o download do livro "A Era das Conseqüências - A Batalha de Learsi" aqui
“Era das Conseqüências” é uma série de livros escrita pelo Reverendo Peterson Cekemp da Cabala Discordiana Orkutcídio em Massa para Adoradores de Lasagna.
A série mistura elementos do gênero de batalhas épicas com ficção científica e reflexão filosófica. De inspiração assumidamente discordiana.
O Reverendo explica:
"A proposta é um grande desafio: ser discordiano em relação ao discordianismo. Quando se lê sobre a história do universo da Era das Conseqüências pode-se pensar que ele não é exatamente bom. Na verdade, não funciona assim. Quando escrevi a história, quis ilustrar uma mudança de contracultura para, de certa forma, algo mais sério, e o desafio, durante algum tempo, foi: como manter as bases de contracultura, agora que a idéia parece estar tão difundida?
Apesar de algum tempo entre essa dúvida, foi necessário arregaçar as mangas e partir para a ação e mais propagação. Então entramos no ativismo: as influências anarquistas fizeram com que fosse imprescindível tomar uma decisão: vamos continuar vivendo uma vida anti-sistema dentro de um sistema? Era hora de mudar isso. Todas as ferramentas estavam à disposição.
A difusão do discordianismo fez com que a mensagem se tornasse um telefone sem fio que distorceu também a mensagem. É o preço a pagar. Isso deu início a uma separação intelectualismo-povo. O povo discordiano pensando de um jeito (o discordianismo é bom, vamos implementá-lo lutando pela nossa emancipação contra os senhores capitalistas), e os reverendos que viam isso como uma marginalização da mensagem discordiana original. Mas enfim, dali em diante o sonho de uma grande nação discordiana foi alimentado de geração em geração, e a guerra foi inevitável. Só depois do acontecido foi possível olhar e dizer: “nossa, o que foi que nós, discordianos, fizemos?”. Mas segundo os vencedores da guerra da luz, havia sido muito esforço (realizado de modo negativo, por assim dizer) por uma causa muito boa, para que tudo fosse jogado fora. Por isso a força para que o sistema se mantivesse…
Veja o que tentei fazer: ser discordiano em relação ao discordianismo. Tentei mostrar o lado ruim de uma massificação (ainda mais que o discordianismo sofreu, como eu especifiquei no livro, uma influência não descriminada de anarquismo, anarquismo radical e democracia em geral…) de uma mensagem hoje ainda confusa, porém clara em sua base. Tentei explorar ao máximo isso, mas parece que no livro tudo parece muito igual.
Por isso escreverei mais histórias extras (pequenos contos) pra ilustrar um pouco de várias épocas retratadas na minha história. Pra entender melhor. Não fique preocupado. A história vai ter tudo reforçado: os próximos livros virão com as coisas que interessam realmente mais fortes e a operação: mindfuck vai começar."
Faça o download do livro "A Era das Conseqüências - A Batalha de Learsi" aqui
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